A autorreflexão e insight nas consultorias de carreiras

Por: Daniela Boucinha – Gestão de Carreira – 

Ao falarmos hoje de carreira, percebemos que os profissionais vão construindo suas carreiras à medida que tomam suas decisões baseadas, principalmente, na satisfação pessoal. Cada vez mais as pessoas buscam formas de trabalho em que possam se sentir, de fato, realizadas. Essa construção deixou de ser entendida, então, simplesmente como uma sequência de empregos e cargos, para dar espaço a uma costura de experiências passadas, atuais e futuras, levando àquilo que faça sentido para o trabalhador. Ou seja, são os significados de histórias e experiências que formatam a carreira de um indivíduo. E para que se encontre esse sentido, o autoconhecimento é fundamental.

No momento que os assessorados procuram a consultoria de carreira, seja por demanda de planejar os próximos passos profissionais ou para o auxílio em uma inserção no mercado, costumo dizer já no primeiro encontro que este processo irá exigir uma jornada de “mergulho em si mesmo”. Essa caminhada não será fácil e, possivelmente, irá “desacomodar” muita coisa e gerar angústias e desconfortos. Porém, essa reflexão é que sustenta todo o planejamento da carreira.

O que comecei a perceber em minha experiência como consultora de carreira é que muitos daqueles profissionais que simplesmente buscavam uma inserção profissional, ou seja uma posição de trabalho, não estavam dispostos a refletir, pois julgavam já saber o que queriam fazer de suas carreiras. Muitos desses buscavam a consultoria para se capacitarem melhor para os processos seletivos e pensarem em como enriquecer os seus currículos, buscando um diferencial frente aos seus concorrentes. Em muitos dos casos, esse foi o foco e trabalhávamos a fundo para “potencializar” esse candidato. Não foram poucas vezes em que esses profissionais conseguiam atingir a sua tão sonhada recolocação, mas retornavam à consultoria depois de pouco tempo por verificarem que não era bem aquilo que procuravam. Eis que comecei a me questionar: ”O que faz com que os profissionais possam aumentar a sua empregabilidade de fato? O que faz com que eles possam se inserir mais facilmente e, mais ainda, manter os seus empregos?”

Como pesquisadora na área do desenvolvimento de carreira passei a estudar mais sobre o tema da empregabilidade e o que poderia ser uma possível causa. Esse foi o meu tema de mestrado, através de uma pesquisa conduzida pelo Escritório de Carreiras e pelo Grupo de Estudos em Desenvolvimento de Carreira da Psicologia da PUCRS. Surpreendentemente, ou nem tanto, o resultado apontou que a autorreflexão aparece como um importante fator que gera a empregabilidade. O processo de se pensar e se autoconhecer é de extrema importância para a implantação da identidade profissional dos indivíduos e de seus consequentes projetos. Quanto mais clara a imagem que se tem de si, mais congruentes serão as escolhas e planos com os interesses individuais. Quanto mais cristalizada for a escolha e decisão profissional (e aqui não falo de profissão, mas de escolha de carreira e trajetória), mais facilmente as pessoas tendem a se comprometer com ela, construindo, assim, o seu core profissional.

Outro fator que se mostrou, ainda mais forte, como causa da empregabilidade nessa pesquisa foi o insight que os profissionais têm a partir de suas reflexões. À medida que as pessoas entendem a forma como constroem suas trajetórias, a maneira como pensam e se comportam, a sua empregabilidade tende a aumentar, contribuindo para que se tornem mais atrativas ao mercado e para que possam realizar transições mais facilmente, de maneira a fazer mais sentido com os seus valores e identidades. A empregabilidade tem muita relação em como os profissionais utilizam e apresentam aos empregadores seus recursos referentes a conhecimentos, habilidades e atitudes. Para que possam chegar a esse entendimento, é necessário que reflitam e cheguem a conclusões sobre essas questões. Mais do que nunca, ficou claro para mim a relevância e impacto dos serviços de consultoria de carreira. Os profissionais poderão estar dispostos a refletirem sobre suas trajetórias, porém ficará difícil encontrar os significados por trás sem o auxílio de um consultor especializado. O papel do consultor e do psicólogo que orienta a carreira é de proporcionar a reflexão e o insight sobre essas trajetórias, mais do que apenas auxiliar em planos de ação ou processos seletivos. Claro que esses aspectos também são de extrema importância e fazem parte do processo de aconselhamento. Porém, acredito que a autorreflexão e o entendimento sobre essas histórias de carreira é que de fato poderão promover a empregabilidade dos profissionais. Passa a ser fundamental que as intervenções de aconselhamento de carreira possam auxiliar as pessoas a refletirem sobre si e sobre as suas competências, para além do contexto em que estão inseridas.

O desafio então dos profissionais que atuam com aconselhamento e consultoria de carreira é de proporcionar essa jornada de autorreflexão, descoberta e entendimento de como cada indivíduo vem construindo a sua trajetória. Isso não é uma tarefa fácil e requer muito estudo, competência e, principalmente, sensibilidade.

A partir do autoconhecimento, os assessorados da consultoria poderão descobrir melhor como funcionam, além de entrarem em contato com suas habilidades e talentos profissionais. Dessa forma, ficará mais fácil construir um planejamento, que terá mais consistência e irá ser sustentado por mais tempo. Tudo isso poderá auxiliar os indivíduos na promoção da empregabilidade e, ao meu ver ainda mais, da trabalhabilidade. No momento em que estamos no mercado, e para onde se direciona cada vez mais o mundo de trabalho, os profissionais precisam pensar não mais em como conquistar e manter seus empregos, mas cada vez mais em como se manter ativo economicamente, através de formas de trabalhos em que utilizem de todo o seu potencial. Isso é o que chamamos de trabalhabilidade. Uma forma de utilizar seus recursos profissionais de maneira a gerar trabalho, não mais exclusivamente a partir de um empregador. E para que isso aconteça, nada mais importante do que o processo de se conhecer e ter insights a partir disso. Minha percepção é de que os profissionais contemporâneos precisam assumir a gestão de suas trajetórias, colocando-se como protagonistas, e parando para refletir e entender realmente o sentido e significado de suas escolhas e histórias profissionais.

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